Qual ? o futuro da favela? por Marianna Araujo e Mar?lia Gon?alves.

15/09/2011 16:14

No dia 22 de março terá início o Fórum Urbano Mundial, organizado pela Agência Habitat da Organização das Nações Unidas (ONU). Por conta deste e dos demais eventos que ocorrem neste mês no Rio de Janeiro, com foco na questão da desigualdade urbana e habitação popular, o Observatório Notícias & Análises preparou uma série de seis entrevistas com estudiosos e militantes ligados a essas questões. A motivação desse especial é refletir acerca do futuro das favelas, mas também das possibilidades da construção de uma cidade mais justa.

O primeiro entrevistado é Guilherme Soninho, do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da UFRJ, e organizador do Fórum Social Urbano, evento que acontece em paralelo ao FUM. Para Soninho os espaços de debate são importantes, mas a transformação da cidade depende da luta e organização dos moradores dos espaços populares. Leia abaixo a entrevista.

 

Guilherme Soninho do Ippur/UFRJ
Guilherme Soninho do Ippur/UFRJ

Esse ano o Fórum Urbano Mundial será realizado pela primeira vez num país da América Latina. Qual é a importância dessa transferência?
É significativo ver que a ONU também olha para os países da periferia do capitalismo mundial. Não há duvidas de que essa opção expressa também o prestígio do Brasil no atual cenário mundial. Por outro lado, o FUM é um encontro muito limitado do ponto de vista da participação popular. Poucos movimentos sociais conseguiram inscrever alguma atividade no FUM, e a inscrição de participantes não prevê, por exemplo, inscrições coletivas de movimentos sociais. Um stand de 9m custa 900 dólares. A realização do Fórum Urbano Mundial no Brasil, por isso, não significa necessariamente um compromisso da ONU com a construção de cidades mais democráticas e igualitárias.

Por que a necessidade de se realizar um Fórum Social Urbano em paralelo ao Fórum Urbano Mundial?
Essa articulação toda começou por conta da falta de canais de participação no Fórum oficial. Os movimentos e grupos universitários que tentaram inscrever atividades não tinham respostas, o espaço para atividades no FUM é muito reduzido, as mesas de debate contam com pouco tempo, etc. Essa situação reforçou a necessidade da organização do Fórum Social Urbano que, diferente do oficial, se propõe a ser um evento dos movimentos sociais, que reflita as lutas e conflitos urbanos, e não um evento de negócios.

O Rio de Janeiro é uma cidade com grande concentração de favelas. Como você entende esse fenômeno?
Sem dúvida as favelas expressam a desigualdade social no Rio de Janeiro. Porém, elas são parte de uma forma própria de desigualdade: as desigualdades urbanas. Elas expressam um modelo de desenvolvimento urbano que concentrou os ricos em poucas partes da cidade. E com os ricos, concentrou também as oportunidades de trabalho.

 

As políticas habitacionais no Brasil têm sua história marcada por ausências de programas e por políticas que beneficiaram principalmente os ricos e as classes médias. Foi assim com o BNH na época da ditadura e está sendo assim hoje também, com os programas habitacionais do Governo Lula.

Para que isso funcionasse bem, seria necessário que as três esferas do governo disponibilizassem terrenos públicos em áreas com infraestrutura de saneamento, transporte, etc., para que fossem produzidas moradias para os trabalhadores pobres.

O problema de infraestrutura nessas favelas é claro e a relação do estado com a população desses locais é, geralmente, de conflito de interesses – vide remoções e construção de muros. Essa é a melhor maneira de se resolver o problema da urbanização?

Não. A melhor maneira de resolver o problema da habitação é com política habitacional para os trabalhadores de baixa renda. Ninguém mora em área risco de desabamentos por vontade. É sempre por necessidade. Não adianta botar muro, tem que dar casa.

Qual é a expectativa do FSU com relação aos planos para os megaeventos que ocorrerão na cidade nos próximos anos?

Dia 24 de março o Fórum terá como eixo principal de debates os megaeventos. Mas posso adiantar que esses megaeventos seguem uma lógica de planejamento que vê as cidades quase como empresas em competição. E, nesses casos, eles são vistos como oportunidades para “vender” a cidade, para atrair investimentos (especialmente o capital estrangeiro). A discussão então é: queremos ser uma cidade atrativa pra quem? Sabemos que o atrativo para o capital é a possibilidade de grandes lucros e poucos riscos. Já para os trabalhadores, o atrativo é uma boa moradia, transportes públicos de qualidade, saúde, educação, etc. Então, qual deve ser a prioridade pra nossa cidade?

Como você vê o futuro das favelas (a médio e longo prazos) em países como o Brasil?

Vejo um futuro de muitos conflitos e lutas. Os países como o Brasil (grandes, mas periféricos) tendem a ter um forte crescimento econômico nos próximos anos. Com isso, temas como habitação e transportes devem figurar nas pautas de lutas dos movimentos sociais e sindicais, assim como nas agendas dos governos.

As favelas cariocas, porém, para serem mais organizadas e influentes na política urbana, precisam superar os problemas da violência. É difícil ser organizado e atuante em espaços comandados pelo tráfico, por milícias ou pela nossa polícia, que desrespeita tanto os direitos humanos mais básicos. Será preciso superar também alguns preconceitos sobre as favelas, preconceitos que existem, algumas vezes, mesmo entre militantes de esquerda.

O que posso assegurar é que um futuro melhor para os moradores de favelas depende da luta e organização desses moradores. E depende também deles conseguirem mostrar para o conjunto da classe trabalhadora que essa deve ser uma luta de toda a classe.

Fonte:http://www.observatoriodefavelas.org.br

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