Brasília perde Gervásio Baptista, 97 anos, símbolo da fotografia
brasileira.
Gervásio nos deixou hoje, mas estará sempre presente na lembrança de
quem viu seu sorriso e ouviu suas piadas. Não tinha como não rir com
ele e não aprender como ele. Gegê, querido de todos, alegre para todos,
gentil com todos. Todos nós sentiremos sua falta.
Deixo uma breve homenagem nas linhas de artigo que fiz sobre ele. É
um texto que fala dele por meio do seu legado: fotojornalismo e a
fotografia como arte.
Meu carinho!
Gervásio Baptista nunca se intimidou com o ambiente solene do Palácio
do Planalto, do Congresso Nacional ou STF, porque, com a bagagem de
quem cobriu a Guerra do Vietnã (1955-75), a Revolução dos Cravos em
Portugal (1974) e foi fotógrafo da Presidência da República durante o
governo de José Sarney (1985-90), sempre transitou entre togados,
políticos e entre balas com a leveza de quem fotografa a vida mirando a
sua efemeridade.
Como tudo começou
O início da carreira desse fotógrafo foi aos 15 anos, quando entrou para
o jornal “Estado da Bahia” com uma câmera de chapa de vidro 9×12 e
um flash “que colocava fogo em tudo”.
Não tinha nem um ano de casa quando foi pautado para fotografar Assis
Chateaubriand, dono dos Diários Associados, recebendo a Comenda do
Vaqueiro, no interior do Estado.
Um jumento tinha sido todo preparado com arreios coloridos e quatro
homens levantaram Chateaubriand no colo para colocá-lo no lombo do
bicho. Chatô vetou a publicação da imagem, mas acabou levando o
jovem fotógrafo para trabalhar no Rio de Janeiro, na revista “O
Cruzeiro”.
No final da década de 50, já na revista “Manchete”, Gervásio cometeu
uma gafe quando pediu um cigarro a um médico argentino que estava
em Cuba. Era Ernesto Che Guevara. O guerrilheiro soltou um palavrão e
disse que cigarro era coisa de norte-americano e aquilo era um autêntico
charuto cubano, “verdadeiro fumo de homem”. A conversa acabou entre
risos.
Fotos mais polêmicas
Nem sempre a relação com fotografados foi assim, tranquila.
Encarregado de cobrir a missa de 30 dias da morte do marido da ex-
miss Brasil Marta Rocha, Gervásio descobriu já na igreja que a viúva
tinha proibido a entrada da imprensa. Tentou se esgueirar pelo telhado
do prédio, mas acabou despencando perto da beldade. Fez uma única
foto, tomou um soco do sacristão e foi preso.
O gosto pelo ângulo privilegiado o levou a subir em uma estátua de anjo
durante o funeral do presidente Getúlio Vargas. Enquanto fotografava,
sentiu uma pessoa puxando seu pé. “Rapaz, você vai cair daí”, advertia
o homem. “Qualquer coisa o senhor me pega”, disse Gervásio para
Tancredo Neves, na época ministro da Justiça.
Mais de 30 anos depois, o então presidente eleito Tancredo estava
internado no Hospital de Base de Brasília. Era necessário mostrar que
Tancredo estava bem e tranquilizar o país. Foi Gervásio, amigo do
presidente, o nome lembrado para fazer a imagem esperada por todos.
Depois de fazer o trabalho, o fotógrafo pediu a Tancredo para acenar
aos jornalistas de plantão, em frente ao hospital. O presidente não quis,
mas prometeu que no sábado seguinte, quando recebesse alta, todos
poderiam fazer fotos. Esse dia nunca chegou.
Texto; e foto Alan Margues