Infancia S/A - por Ivaldo Cavalcante.

29/09/2011 13:35

 
Fabio tem 16 anos, seu corpo é anêmico, desnutrido e com muito sinal de fraqueza. Seu maior vicio é a cola de sapateiro e o uso do thinner. Na falta do thinner e da cola, ele tem seu laboratório imaginário fazendo o uso de várias tintas misturando todas juntas.Seus olhos não têm brilho.
É um adolescente abandonado como tantos outros. Ele dorme dentro de um contêiner na QI 7 do Setor de Indústrias na cidade-satélite de Taguatinga.

Ao lado do contêiner, há varias oficinas. Ele guarda suas latas de tintas vazias e suas velhas roupas em um varal feito de pedaços de ferro.
Ao acordar todos os dias, ainda com os raios do sol da manhã, ele levanta com seu velho e sujo moletom vermelho com capuz, puxa seu cobertor de papelão, se espreguiça aos meios de restos de lixo deixados pelas oficinas do dia anterior.
Acorda com os raios dourados da manhã em seus olhos, ele sobe a rua com suas pernas apressadas, vai até o segundo contêiner que fica a umas 3 quadras de distência.
O contêiner fica de frente para um colégio particular chamado Brasil Central, na Avenida Samdú Norte.
Vão chegando vários estudantes, muitos em companhia dos seus pais.
A um metro do seu contêiner, carros e ônibus vindo de diversos lugares (Ceilândia , M-Norte, Taguatinga Sul) passam em alta velocidade indo para o trabalho
Enquanto isso, Fábio tira seu café da manhã dos restos dos detritos deixados pela sociedade.

Quando as crianças entram na sala de aula, ele sai de dentro do contêiner, atravessa novamente a avenida Samdú, passa sempre na banca de jornal Tupá, onde ganha de seu Francisco um cafezinho. “Este menino precisa de muita ajuda, outro dia ele começou a jogar pedra nos carros, quase acertou uma criança dentro” disse Francisco
Os dados do IHA, além de inéditos, são alarmantes. O risco de um adolescente brasileiro morrer é 33 vezes maior que o de uma criança. Se esse adolescente for negro, a probabilidade será 2,6 vezes maior quando comparado com os brancos. Dos adolescentes que morrem todo ano no país, 46% são assassinados.
Infelizmente a cada dia que passa o número de adolescentes que são atraídos para a criminalidade cresce em todo o país.
 
Nesse caso, é possível estimar que o número de adolescentes assassinados entre 2006 e 2012 ultrapasse 33 mil. Ou seja, se as condições existentes nas cidades pesquisadas persistirem, o país perderá 13 adolescentes por dia.
Fonte(( IHA

 
Entrevista com a Deputada Federal Maria do Rosário, Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Camara dos Deputados.

 
1) O que o Governo Federal tem feito para a acabar com este grave problema do vício em menores (crack, cola, maconha) e com problemas de loucura causado pelo vício?
 
 
Deputada Maria do Rosário:

Não adianta dourar a pílula. A quantidade de menores viciados no país cresce numa proporção superior ao patamar onde as políticas públicas de prevenção ou atendimento ao contingente cada vez maior de viciados pode alcançar. É preciso haver um esforço conjunto de todas os níveis de governo (federal, estadual e municipal) e ainda a participação e o envolvimento da sociedade civil, da mídia, das escolas e das famílias para atenuar este que já pode ser o maior mal deste novo século.Temos que tratar a questão do consumo de drogas, seja elas de qualquer tipo, por parte de crianças e adolescentes, como um flagelo, um caso de calamidade pública. Ao lado de políticas de inclusão social - educação, cultura, lazer, políticas de compensação de renda para as famílias, etc – o que já vem sendo feito pelo atual Governo é preciso uma ampla mobilização social no sentido de conscientizar a sociedade para que, pelo menos, num curto espaço de tempo, não haja nenhum novo viciado.Se conseguirmos estancar o número de novos viciados poderemos concentrar recursos e esforços no sentido de atender quem já está no vício, um processo necessariamente lento, doloroso, custoso mas de fundamental importância para todos os cidadãos e cidadãs brasileiras já que, infelizmente, o consumo de drogas já se disseminou por todas as classes sociais e por todas as cidades brasileiras.

 
2) Qual o cenário real do abandono infantil no Brasil?

 
Deputada Maria do Rosário:

As estatísticas trazem em si um grande paradoxo. Por um lado temos um cenário trágico de milhares de crianças e adolescentes abandonados perambulando por ruas e becos do país, sem família e sem a mínima assistência do Estado e, de um outro lado, também olhando-se as estatísticas, vemos a melhora considerável no atendimento destas mesmas crianças em virtude das políticas de transferência de renda, tipo bolsa-família, que vem retirando da miséria milhões de brasileiros nos últimos anos.O cenário que devemos confiar é o da nossa indignação, o da capacidade de cada um se considerar parte desse todo e se sentir responsável por esta calamidade. No Congresso Nacional tenho lutado diuturnamente para reverter este quadro. Agora mesmo conseguimos aprovar alterações numa legislação arcaica e aprovar penas mais duras para crimes sexuais contra crianças e adolescentes. Também houve uma melhora legislativa no campo da adoção e em outras áreas que atenuam o problema do abandono infantil no país.

 
3) Quais as maiores dificuldades para erradicar esta situação?

 
Deputada Maria do Rosário:

O primeiro desafio – a primeira dificuldade - estamos vencendo. Como afirma o Presidente Lula, nunca na história desse país se teve a preocupação de aliar desenvolvimento econômico, com justiça social; crescimento do PIB, com distribuição de renda; incremento nas exportações e aumento de consumo pelas classes “D” e “E”. Este é o primeiro passo. Dar emprego, renda e cidadania para as pessoas. O que importa, neste caso, é transformar estas políticas em políticas de Estado que não possam ser desmontadas pelos futuros governos.

O segundo passo, ou a segunda dificuldade, é o da conscientização e da mobilização constante, particularmente na luta pela erradicação dos vícios. É preciso alertar as pessoas, ganhar o coração de cada uma delas, no sentido de que cada um se coloque também como vítima ou como uma potencial vítima deste flagelo. Este não é um problema apenas da polícia, do Estado ou dos familiares dos envolvidos. Tem que ser assumido por todos, claro, cobrando-se dos agentes públicos suas responsabilidades maiores na resolução dos problemas.
 
 
Texto e fotos: Ivaldo Cavalcante. (arquivo)

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